Virgílio e os cantadores
VIRGÍLIO E OS CANTADORES
Salvador – BA 03/05/2005
Das razões de escrever este ensaio
“Os mais antigos versos sertanejos eram as ”quadras”. Diziam-nos ‘verso de quatro’. Subentendia-se ‘pés’, que, para o sertanejo, não é a acentuação métrica, mas a linha”. Câmara Cascudo. Vaqueiros e Cantadores1
Vivi boa parte da infância no sertão cearense, nas cidades de Quixadá, Crato e Sobral, e, assim, tive oportunidade de ver e ouvir os violeiros e cantadores da minha terra. Lembro-me de que, nos dias de feira, eles chegavam, junto com os tropeiros, no lombo de fogosas burras, onde traziam suas rabecas e outras matulas. Eu não seria, hoje, capaz de descrever, com detalhes, o clima daquelas cantorias (às quais meu pai, um sertanejo de Quixadá, me levava), mas a elas fui, instantaneamente, transportado, quando, muitos anos depois, ouvi Caetano Veloso cantando “Circuladô de Fulô”, acompanhado pelo violoncelo do “cego tocadô” Jaques Morelenbaum.2
Por esta mesma época, tive também o primeiro contato com a literatura de cordel, através daqueles livrinhos rudimentarmente impressos, que eram vendidos nas feiras e mercados. No Crato, durante as festas da padroeira, Nossa Senhora da Penha, tive o privilégio de ver Luiz Gonzaga, acompanhado por zabumba e triângulo, cujas canções, divulgadas naqueles “bolachões” de 78 rpm, eu sabia de cor.
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CâMARA CASCUDO, Luis da: Vaqueiros e cantadores. VELOSO, Caetano. Circuladô de Fulô. Música de Caetano Veloso, letra de Haroldo de Campos.
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Aos doze anos, minha vida mudou inteiramente, pois fui estudar num seminário, em Fortaleza, o conhecido seminário do Barro Vermelho, onde fiquei muitos anos. Foi a vez, então, de entrar em contato com a música clássica, a música sacra, a literatura de língua portuguesa e também com as obras de escritores e poetas latinos e franceses, entre os quais, naturalmente, Virgílio. O convívio com estas diferentes formas de manifestação artística me fez, já adulto, numa ampla